O Herdeiro Legítimo do Trono do Contencioso

 O Herdeiro Legítimo do Trono do Contencioso


Este conto passa-se num tempo e espaço remotos e longínquos. Devido a uma linhagem confusa e à ausência de um filho legítimo que fosse de conhecimento público, a morte do Rei originou um problema de sucessão no Trono do Contencioso.

De todos os cantos do reino, chegaram à capital milhares de supostos herdeiros que reivindicavam para si a coroa.
Entre eles, o mais forte candidato era Arti Gonono. Ele alegava a titularidade do direito ao Trono do Contecioso porque, segundo A Lei do Reino, era o sucessor mais direto do Rei defunto. Arti dizia que “essa norma jurídica, que visava não só a satisfação do interesse público, mas também a proteção dos interesses dos particulares, lhe conferia uma situação de vantagem objetiva”.
Porém, a Corte do Rei tinha outras intenções. Sabendo da fama de desordeiro e da vida de deboche de Arti, estes ilustres nobres escolheram, entre si, o futuro rei. Foi apontado como sucessor Herde Eiroile Gítimo, patriarca de uma família riquíssima e respeitada na sociedade.
A cerimónia de coroação deu-se imediatamente a seguir a esta decisão e espantou todo o povo. A ilegalidade deste ato era notória para todos e a contestação foi geral. Arti recebeu a notícia com imensa tristeza e sentiu-se consumido por um sentimento de derrota e imputência. A sua mãe, Núme Rodois do Arti Gonono, equacionou ajudar o filho através de uma ação popular, ela queria agir para a defesa da legalidade e do interesse público, mas viu a sua pretensão impedida por Arti que tinha ganho um novo fôlego. Com uma vontade renovada, decidiu intentar uma ação contra a Corte, porque era o órgão responsável pela sucessão e porque nomeou e coroou Herde como Rei, recorrendo à alínea a) do número 1 do artigo 68º e ao número 2 do artigo 10º do Codex Procedimental dos Tribunais de Acções (mais conhecido por CPTA).
Na sua contestação, a Corte suscitou dúvidas sobre a própria legitimidade passiva, pois, segundo o entendimento deste órgão, em juízo deveria estar o Reino, isto porque “nos processos intentados contra entidades públicas, a parte demandada é a pessoa coletiva de direito público”. Ou seja, ao demandar a Corte a ação estaria ferida de uma ilegitimidade passiva que resultaria na absolvição da instância do réu.
O juiz do processo entendeu que o legislador, no artigo 10º do Codex Procedimental dos Tribunais de Acções, considerou a pessoa coletiva como sujeito passivo das relações processuais, estabelecendo, porém, uma exceção em relação ao Reino, considerando que devem ser imputados aos órgãos do Reino os atos praticados pelos órgãos, sendo eles os verdadeiros detentores da legitimidade passiva nas ações.
Chegado a esta conclusão, e tendo sido pedida na petição inicial a condenação da Corte à pratica do ato devido (nomeação e coroação de Arti Gonono como Rei), não sendo contestadas as afirmações do autor acerca da ilegitimidade de Herde e da coroação indevida e fraudulenta deste, o juiz, na sua sentença, condenou a Corte a satisfazer o pedido do autor.
Pouco tempo depois, Arti Gonono foi coroado Rei do Contencioso.

Miguel Dinis Lucas
140114088

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