DECISÃO DA CAUSA PRINCIPAL NO ÂMBITO DE PROCEDIMENTO CAUTELAR - É URGENTE???

ANÁLISE DO ACÓRDÃO DO TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO DO SUL 
Processo 02343/07

Resumo dos Factos:

-       A Associação X interpôs recurso jurisdicional da sentença do TAF de Lisboa que, antecipando o juízo sobe a causa principal (nos termos do artigo 121º CPTA), absolveu a Federação Y dos pedidos contra estas formulados, nos autos de providência cautelar, que veio alterar o modo de disputa dos campeonatos nacionais, nos escalões de juniores e seniores masculinos e femininos.
-       Tratava-se de providência cautelar de suspensão de eficácia do ato administrativo, nos termos do artigo 112º/2 a) CPTA.
-       A tutela cautelar foi convertida em tutela definitiva, no âmbito do processo cautelar (implicando a decisão do mérito da causa principal).

Neste caso, a questão de saber se a tutela cautelar convertida em definitiva permitia a manutenção da natureza urgente era relevantíssima, na medida em que o recurso tinha sido interposto decorrido o prazo de 15 dias. Ora, nos termos do artigo 144º/1 do CPTA, o prazo normal para interposição de recurso é de 30 dias a contar da notificação da decisão recorrida, mas o prazo de interposição de recurso no âmbito de processos urgentes (providências cautelares) é de 15 dias.
A tutela cautelar em causa tinha sido convertida em tutela definitiva, no âmbito de processo cautelar, o que implicou, necessariamente, a decisão sobre o mérito da causa principal. A questão assentava, então, em saber se a ação principal tinha perdido a natureza de urgência, no âmbito do recurso interposto.  
Como ponto de partida, cabe referir que o artigo 121º/1 do CPTA dispõe o seguinte: “Quando a manifesta urgência na resolução definitiva do caso, atendendo à natureza das questões e à gravidade dos interesses envolvidos, permita concluir que a situação não se compadece com a adoção de uma simples providência cautelar e tenham sido trazidos ao processo todos os elementos necessários para o efeito, o tribunal pode (...) antecipar o juízo sobre a causa principal”.
Poderíamos, assim, formular dois entendimentos relativamente À questão em análise:

1.          O recurso da decisão tomada antecipadamente, sendo de pronúncia sobre os pedidos da causa principal, não é um recurso respeitante à adoção de providências cautelares e, por isso, não tem a natureza urgente do artigo 147º/1 CPTA;
2.          No caso em que as partes aceitem e o juiz acione o mecanismo previsto no artigo 121º CPTA, deve considerar-se que a causa principal – que não é urgente – foi decidida no âmbito de um procedimento cautelar e, por esse, motivo adquire o caráter de urgência

Parece-nos que a posição a adotar deve ser a de considerar que a ação principal tem natureza urgente, na medida em que a adoção da primeira posição levaria à negação da tutela cautelar assegurada pelo artigo 121º CPTA. Assim é porque, nos casos de aplicação do artigo 121º CPTA, impõe-se que o juiz entenda que, face à manifesta urgência da resolução definitiva do litígio e à natureza das questões analisadas, se exija uma resolução definitiva do litígio, não devendo, por isso, perder a natureza urgente – teria de ser esta a solução porque, de outra forma, não se decidia a providência cautelar (porque, na verdade, foi convolada numa decisão principal) e, não admitindo que a decisão da causa principal é urgente, o processo perdia a característica de urgência que o define e que é exigido pelo circunstancialismo que o rodeia.
Assim sendo, consideramos que deve admitir-se a interpretação extensiva do artigo 147º CPTA, em conformidade com o princípio constitucional da tutela jurisdicional efetiva, de modo a integrar as decisões sobre o mérito da causa principal proferidas ao abrigo do artigo 121º do CPTA, na categoria de decisões respeitantes à adoção de providências cautelares. Como consequência, as decisões proferidas em processos urgentes são sempre, em rigor, decisões respeitantes a providências cautelares.

Breve comentário à possibilidade conferida pelo artigo 121º CPTA:

Em abstrato, a solução é bastante positiva, na medida em que permite simplificar as regras processuais e trazer maior celeridade ao julgamento dos casos (nomeadamente, reduz as ações para metade – uma ação de providência + uma ação para julgar a causa principal, passam a ser apenas uma). O problema surge com a aplicação prática da regra do artigo 121º do CPTA – a aplicação desta disposição legal conduziu, na prática, à mistura entre processo cautelar e processo principal.
Os particulares, como consequência da possibilidade de procedimentos cautelares poderem (cumpridos os requisitos) ser convolados em ações principais, passaram a incluir no pedido cautelar todas as questões que deveriam ser tratadas pelo pedido principal  (na esperança que, trazendo “todos os elementos necessários” – artigo 147º CPTA -  para o juiz conhecer da causa principal, pudesse ficar definitivamente resolvido o litígio).
Como, facilmente, se pode depreender, os processos cautelares que, pela sua natureza urgente, exigem decisões céleres por parte dos juízes começam, cada vez mais, a ser morosos, o que implica uma consequência precisamente oposta à querida pelo legislador quando criou o regime do artigo 121º CPTA.
A única solução que permite aplicar, sem entraves, o artigo 121º e, simultaneamente, garantir que não é posta em causa a celeridade necessária aos procedimentos cautelares parece ser a possibilidade de os juízes apenas terem em conta, no âmbito da decisão de procedimento cautelar, os factos e/ou questões relevantes para a decretação da providência (em vez de todas as questões trazidas pelas partes e que, de acordo com o procedimento normal, se enquadrariam na decisão principal).


Madalena Silva

Nº 140114045

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