Arbitragem administrativa- Onde estamos?

A Arbitragem é uma forma alternativa de resolução de litígios que aparece consagrada no art. 209º.2 CRP, onde se percebe que apesar de ser uma forma alternativa nem por isso deixa de ser uma forma jurisdicionalizada de o fazer. Não deixamos de estar aqui no âmbito da função jurisdicional do Estado de garantir a todos o acesso à Justiça (art.20º CRP), e por isso podemos mesmo dizer que os tribunais arbitrais apesar de todas as suas especificidades não deixam de ser verdadeiros Tribunais. Perante uma dada de situação de conflito que lhe é apresentada o tribunal arbitral, à semelhança do tribunal estadual, tem a obrigação de dizer qual o direito naquele caso. São Tribunais que se constituem com base no princípio da autonomia da vontade (arbitragem recolhe aqui a sua legitimidade) onde são as partes de uma relação jurídica que livremente convencionam que se surgir um dado conflito em determinada situação este é resolvido recorrendo a arbitragem. Vamos aqui, portanto, analisar a arbitragem voluntária e não a arbitragem necessária.
Levante-se depois a questão de perceber o porquê de se recorrer a arbitragem quando existem tribunais estaduais com a competência necessária para resolver tais conflitos. Urge aqui apresentar as vantagens da arbitragem: celeridade (mais rápida que a justiça estadual) dado estabelecer a LAV (lei de arbitragem voluntária) um curto prazo para a o tribunal arbitral decidir (prazo geral de 1 ano que pode ser prorrogado); especialização dos árbitros (partes do no litígio têm o poder de escolher os árbitros que sejam peritos na matéria em juízo) nos tribunais arbitrais ao contrário dos tribunais estaduais em que me sujeito à distribuição; flexibilidade do processo (na comparação com o processo administrativo); se houver um litígio contra o Estado há uma ideia de maior imparcialidade do tribunal arbitral do que do tribunal estadual. Mas há também que referir que a arbitragem não são só vantagens, também existem inconvenientes: arbitragem é mais cara do que o normal processo nos tribunais estaduais; na arbitragem não é possível recorrer a assistência judiciária (podem não ter meios para pagar aos árbitros); os tribunais arbitrais não estão munidos de ius imperii (tem de se pedir ao tribunal estadual que obrigue a testemunha a vir, por exemplo, depôr), por isso não têm o poder injuntivo de fazer valer o direito (problema de coercibilidade).
Depois de percebermos aqui quais as razões que poderiam levar as partes a querer ou não querer submeter um dado litígio a arbitragem cabe agora perceber (olhando em especial para a arbitragem administrativa) em que situações é possível a arbitragem. A LAV dá-nos seu art. 1º 1 e 2, dois critérios de admissibilidade de arbitrabilidade dos juízos: o critério da disponibilidade do direito (direitos que as partes podem legal e legitimamente dispor, extinguir, denunciar…) e o critério da patrimonialidade (dado direito poder ser sujeito a avaliação pecuniária). Para além disto, no art. 180º.1 são-nos apresentadas situações em que é possível, de facto, aquelas questões serem resolvidas por um tribunal arbitral. Aqui o art.º 212, nº3 da CRP tem uma grave importância porque quando alude a tribunais administrativos, deve ser lido não apenas como abrangendo os tribunais permanentes do Estado, mas também os tribunais administrativos arbitrais. Isto tem, naturalmente, consequência evidentes no processo arbitral. E a primeira delas é a de que, desde que, no respeito pelo princípio da separação e interdependência dos poderes, os tribunais arbitrais, como tribunais que são, só podem julgar do cumprimento pela Administração das normas e princípios que a vinculam. Ou seja, os árbitros têm o dever de limitarem a sua acção à fiscalização da legalidade da actuação administrativa, não só, através da aplicação de regras jurídicas, como também de princípios (art. 185º.2 CPTA). Isto é prova de que abrir a porta à arbitragem não significa necessariamente abrir a porta à equidade. Além disso, os tribunais arbitrais para administrarem a justiça têm de se revestir de importantes garantias como a imparcialidade e independência. E é aqui que se encontra a relevância do Centro de Arbitragem Administrativa, também conhecido por CAAD (art. 187º CPTA). De referir, que para que seja possível  que as partes interessadas nisso possam submeter lítigios derivados de actos administrativos da Administração será necessário que as entidades que praticam estes actos se vinculem antes a certos centros de arbitragem institucionalizados, como é o caso do CAAD (art. 187º CPTA).
Percebendo já a verdadeira jurisdicionalidade dos tribunais arbitrais cabe agora entender o que é que de verdadeiramente relevante houve na evolução da ideia de arbitrabilidade de questões de contencioso administrativo. E aqui urge referenciar a evolução existente no CPTA quanto à admissibilidade de arbitragem de questões relativas aos actos de formação dos contratos. O Professor MÁRIO AROSO DE ALMEIDA, desde 2004, que dizia que com a admissão de arbitragem de actos de execução de contratos, que não havia uma congruência do sistema, isto é, um critério lógico, porque não se permitia depois que houvesse essa admissibilidade de arbitragem com os actos de formação dos contratos. Há, porém, que dizer que parte da doutrina já consentia esta hipótese antes da referida reforma por uma questão de coerência sistemática. Em 2015, é desfeita esta incongruência com a alínea c) do art.º 180, nº1 ao se admitir genericamente “a constituição de tribunal arbitral em questões respeitantes à validade de actos administrativos, salvo determinação em contrário”. De referir, porém, a limitação à admissibilidade de arbitragem nesta situação devido a no art. 180º. 2 CPTA se prever que quando existam contraintessados a regularidade da constituição do TA depender de aceitação dos mesmos do compromisso arbitral.

Ora, para concluir, parece ser benéfica esta alteração de regime quanto ao acrescento desta alínea no art. 180º do CPTA, pois é mais um passo que a lei dá ao definir de forma mais lata um mecanismo de resolução de litígios consagrado e promovido constitucionalmente, vindo aproximar o regime do CPTA de um princípio de admissibilidade geral de arbitragem em relações administrativas, devendo o legislador excluir em legislação especial as matérias que achar oportuno.

Afonso Virtuoso

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