Alterações em matéria de impugnação de actos administrativos
O Decreto-Lei 214-G/2015 e as alterações
em matéria de Impugnação de Actos Administrativos
Antes de iniciar
uma análise sobre as principais alterações introduzidas pelo novo CPTA no que
toca à matéria da impugnação de actos administrativos - com a aprovação do Decreto-Lei 214-G/2015 - importa esclarecer,
sumariamente, a importância que este regime tem no quadro do Contencioso
Administrativo.
Assim irei fazer
uma exposição daquelas que foram as principais alterações feitas - na definição
de quais os actos impugnáveis; legitimidade e prazos - pelo legislador no novo
CPTA que culminaram com uma maior protecção do particular.
Modo de
utilização – Instruções da Impugnação de Actos Administrativos.
(1) Identificar
quais os actos impugnáveis do nodo CPA
O novo CPTA
começa logo por alterar a definição de “acto impugnável”.
Diz o artigo 51º
que “ainda que não ponham termo a um
procedimento, são impugnáveis todas as decisões que, no exercício de poderes
jurídico-administrativos, visem produzir efeitos jurídicos externos numa
situação individual e concreta, incluindo as proferidas por autoridades não
integradas na Administração Pública e por entidades privadas que atuem no
exercício de poderes jurídico-administrativos”.
Através da
alteração desta definição podemos concluir que o legislador quis ver aqui
alargados os actos que podem ser impugnados, uma vez que a administração não pode injustificadamente
lesar os direitos dos particulares e que estes, caso se achem lesados e tenham
legitimidade, possam actuar.
Nos termos do
referido artigo - artigo 51º CPTA - as decisões em causa são: directamente
impugnáveis; se não puserem termo a um procedimento só podem ser impugnadas
durante a pendência do mesmo; caso existam vícios durante o procedimento que,
portanto, põem em causa a legalidade da decisão final, não se estando assim na
pendência do procedimento há, na mesma, possibilidade de impugnação - salvo
quando “essas ilegalidades digam respeito
a acto que tenha determinado a exclusão do interessado do procedimento ou a
acto que lei especial submeta a um ónus de impugnação autónoma” - nos
termos do número 3 do artigo.
Quanto aos actos
administrativos confirmativos e de execução - artigo 53º CPTA - o
legislador pretendeu esclarecer que os
actos confirmativos não são, regra geral, impugnáveis.
O legislador
definiu, agora, o que são actos meramente confirmativos dizendo que são “actos que se limitem a reiterar, com os
mesmos fundamentos, decisões contidas em actos administrativos anteriores”.
No entanto
existem excepções a este “princípio” de não impugnabilidade de actos
confirmativos, expressos no número 2 do referido artigo. Segundo este número
estes actos podem ser impugnados quando o
interessado não tenha tido o ónus de impugnar o ato confirmado, por não se ter
verificado, em relação a este ato, qualquer dos factos previstos nos números 2
e 3 do artigo 59.º.
Quanto aos
efeitos da sentença de impugnação de um acto meramente confirmativo diz-nos o número
4 que estes se são extensíveis ao acto confirmado.
Quanto ao número
3 do artigo 53º, que refere a impugnabilidade dos actos jurídicos de execução,
de actos administrativos confirmativos, está expresso que “só são impugnáveis
por vícios próprios, na medida em que tenham um conteúdo decisório de carácter
inovador”.
Quanto aos actos
ineficazes o legislador continuou a estabelecer a regra da sua
inimpugnabilidade, ressalvando as inalteradas excepções.
(2) Referir
o que toca à legitimidade activa
Neste ponto
importa dizer que houve apenas uma grande alteração.
Esta prende-se
com a restrição da legitimidade activa
nas acções impugnatórias intentadas por órgãos administrativos
relativamente a actos praticados por outros órgãos da mesma pessoa colectiva.
Os actos administrativos, ao contrário do que acontecia até esta revisão de 2015,
apenas podem ser impugnados por um órgão da mesma pessoa colectiva quando “comprometam as condições do exercício de
competências legalmente conferidas aos primeiros para a prossecução de
interesses pelos quais esses órgãos sejam directamente responsáveis”. Assim
reduz-se o número de órgãos da mesma pessoa colectiva que têm legitimidade para
poder pedir a impugnação de um acto administrativo.
O artigo 56º que
trata da aceitação do acto administrativo, e que foi apontado como sendo uma
mudança na legitimidade por alguns, não traz uma verdadeira mudança. Não é
unânime que se trate rigorosamente de uma situação de legitimidade activa, mas
sim de “interesse em agir” pelo que, apesar de ter sido uma alteração ao regime
não é, maioritariamente, aceite que se integre esta alteração neste subtema de
legitimidade, como defende o Professor Mário Aroso de Almeida.
(3) Prazos
– o artigo 58º CPTA
A duração dos
prazos não se alterou uma vez que continua a não haver prazo para a impugnação
de um acto administrativo nulo e um ano (caso o impugnante seja o Ministério
Público) ou três meses (caso o impugnante seja outro interessado) para a
impugnação de actos anuláveis.
A alteração
radical, então, prende-se com a forma como são contados os prazos de impugnação.
Os prazos contam-se “nos termos do artigo
279º do Código Civil”, em vez do Código do Processo Civil como estava
expresso na antiga redação do artigo. Esta alteração prende-se com a
justificação de este prazo ser um prazo substantivo - uma vez que é um prazo
para o exercício de um direito, o direito de acção, constitucionalmente
garantido. No entanto, esta alteração que pretendia ser “clarificadora” acabou
por ser uma desvantagem para o particular uma vez que causa uma maior incerteza
quanto à contagem dos prazos de impugnação, uma vez que existem algumas dúvidas
na interpretação das alíneas b) e c) do artigo 279º do Código Civil. Na opinião
do Professor José Duarte Coimbra “a
segurança jurídica aponta indiscutivelmente não para a alteração do regime (...)
mas antes para a sua manutenção”. Apesar de alguns dos problemas de
interpretação das alíneas anteriormente referidas já estarem ultrapassadas, em
parte, considera-se que esta alteração não veio “clarificar”, o que pretendia
fazer.
Há ainda outras
alterações que merecem ser elencadas.
O elenco das
situações em que se pode, ainda, recorrer à impugnação de actos administrativos
decorrido o prazo de três meses previsto na alínea b) do número 1 do artigo 58º
também se alterou. Embora o justo impedimento e o erro continuem a ser as mais
importantes das causas que permitem a ultrapassagem do prazo de três meses, na
antiga redação não poderiam ser invocadas depois de decorrido o prazo de um
ano. Hoje é quase unânime quando se interpreta o artigo que se pode impugnar um
acto administrativo mesmo decorrido o prazo de um ano após a prática do acto
(ou da sua notificação).
Quanto ao termo
inicial da contagem do prazo diz o artigo 59º/1 que só podem ser impugnados os
actos a partir do momento em que estes produzem efeitos, excepto se se tratar
de um acto ineficaz que possa ser contenciosamente impugnado - número 2 do
artigo 54º CPTA. Assim a alteração trazida pelo novo CPTA reforça a ideia de
que o prazo apenas começa a contar, salvo a excepção anteriormente apresentada,
a partir do momento em que o acto administrativo começa a produzir feitos.
Assim, podemos
concluir que, para além da configuração do modelo único de acção
administrativa, os pontos apresentados foram as maiores/mais profundas
alterações introduzidas pelo Decreto-Lei nº214-G/2015 em matéria de impugnação
de actos administrativos.
Raquel Mendes Ribeiro
Nº 140113138
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